Ela deve ter consultado o relógio do celular pelo menos cinco vezes, mas nada de chegar a sua vez; a morosidade da fila devia-se ao fator registro, cada cidadão deveria assinar um papel dando conta do recebimento. E haja assinatura; O sol de rachar esquentava as conversas e queimava as insinuações sobre a procedência do produto, mas tudo acabava em banho maria, pois a data, mais uma vez comentada, era favorável às práticas que poderiam dar na vista em um dia comum.
Um ônibus cheio de turistas parou bem do lado da fila para pedir informação e antes que chegasse ao político bondoso, ele se esquivou numa saída estratégica para o banheiro; Os ajudantes do benévolo cidadão se adiantaram a qualquer pergunta e disseram o porquê de tamanha generosidade. Os turistas, estupefatos, perguntaram onde vendia cerveja, ou qualquer coisa que matasse a sede; Alguns ajudantes quiseram ainda dar maiores explicações, mas o motorista já dava sinais de impaciência com tamanha enrolação e meteu o pé, deixando a assistência falando sozinha. Logo o pacato e bondoso cidadão voltou à cena, ainda mais sorridente, proferindo uma parábola que não me vem à memória.
Minha mãe passou o resto da semana sentindo os pés, o resto do mês cozinhando o feijão, mas segundo ela de consciência limpa, afinal pagara uma penintência ao entrar em fila tão grande aos 65 anos e ceder lugar aos mais idosos que ela; Além do mais não havia mal nenhum aceitar uma esmola na Sexta-Feira da Paixão.
Quem dorme muito sossegado é o dito político, afinal é um homem bondoso, lembra dos eleitores até na Semana Santa; A consequência natural é o partido fortalecido, pronto a ajudar os cidadãos sempre com uma boa desculpa. O bom político tem variadas datas no ano, minha mãe as mesmas desculpas.
Jaécia Bezerra de Brito